tudo é sempre texto com palavra ou sem palavra tudo é texto o homem na rua é texto a chuva sobre o homem é texto casas molhadas vistas à distância comovem é texto e todo texto é narrativa uma palavra uma letra uma vírgula um lapso semântico um entre parêntesis vazio é tudo texto e todo texto é narrativa nada é só folhagem ao acasoque saco!
Prefiro um sátiro nu que um unicórnio encapotado. Um bicho apenas domado por uma virgem deve ser insuportável! E tem um chifre como um falo. O sátiro é todo falo e todo fala. O unicórnio é mudo. O sátiro é a luxúria em pessoa, se pessoa um sátiro é. E nu se basta. Não esconde nada. O unicórnio vive às ocultas no colo das donzelas, escondido numa metáfora, numa alegoria, numa figura de linguagem.
à Vitória da Samotrácia
o ar do mar insufla tuas
vestes
tuas asas de pedra
teu olhar sem cabeça
és uma Górgona?
pairas sobre nossas cabeças
agônicas, Vitória
Niké
é para nós que exibes a tua glória,
ou é nossa a glória de tua vitória?
os seios que inflas
as asas que moves
esplendem a nossa derrota?
sublime pedra
que arrojas e voa
à proa de uma nave
fuma na cama o homem que eu amo e joga a fumaça na minha cara é descarado o homem que eu amo senão, não seria o homem que eu amo o homem que eu amo é um canalha é uma cilada mas é belo e na cama faz o que quer que é o que eu quero o homem que eu amo debaixo do chuveiro o homem que eu amo batendo perna na rua de chinelos sai pra comprar cigarros e não volta pro jantar nunca mais- .
pela janela
pela janela do escape
Cinderela vê o baile
Em que valsam animais
– nada mais,
ou menos –
ao menos
Cinderela perdeu o sapato
À noite, no baile
Cinderela se vê
brilhar como estrela
.
de uma superfície de merda
carcaças se amontoam
de bicho, gente e planta
formando ilhas de corpos,
horripilantes
seres que morrem
agarrados uns aos outros
em gestos de extrema aflição
imensas gotas de óleo boiam num mar de sangue
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